Nasci no ano em que o país saudava a Bossa Nova, que surgia pelas deliciosas harmonias do “Chega de Saudade”, de Tom e Vinícius, cantado pela divina Eliseth Cardoso e ao som do violão de João Gilberto.. . Era a famosa primeira batida desta verdadeira revolução musical que teve nariz torcido de sambistas e saudação entusiasmada de quem percebia, daquela criação, a essência, a sublime integração entre quase jazzísticos arranjos e o que há de mais belo, em poesia. Era o samba sincopado abrindo passagem. E vim ao mundo em uma segunda-feira de carnaval, 4 da manhã, não poderia ser diferente. Cheguei colorida, pura fantasia, marchinhas com grifes estupendas como Ataulfo Alves, Herivelto Martins, Zé Ketti, Mário Lago, Assis Valente, Ary Barroso, Lamartine Babo e, claro, Noel Rosa. Meus pais, Francisco e Maria Myzia, também nasceram com a música na alma. Minha mãe estuda piano ate hoje e meu avô paterno, Roberto Barbosa Ribas, era maestro, compositor, arranjador, tocava vários instrumentos e acabou formando uma orquestra integrada por filhos, genros, noras e netos, consagrada na Santa Maria (RS) da minha identidade. Na infância, eu, minhas quatro irmãs e um irmão, costumávamos ficar até tarde desfrutando das noites de verão nos balanços que meu pai instalou em nossa casa – e, ali, cantávamos até a madrugada. E inventávamos vozes, arranjos, assovios e harmonias. Integrei grupos de canto lá e aqui, cantei na noite enquanto cursava a faculdade de Comunicação Social, na Universidade Federal de Santa Maria, nos misteriosos anos finais da década de 70. As letras, no entanto, assumiam, gradativamente, importância maior para mim. Não queria apenas cantar – queria decifrar a beleza do verbo, decodificá-lo e metabolizá-lo em cada desvão de mim. Minha profissão me inunda de poesia, mesmo que não queira. Do pé no chão, que o ser jornalista precisa ter, à liberdade do verso solto, sangrado, que voeja sobre todas as minhas poucas certezas, me equilibro na beleza e peço socorro às janelas escancaradas de todas as lindas almas que me rodeiam. Cronista de A Notícia por quase 20 anos, coletânea publicada, fui alegre integrante do Madrigal Belas Artes - do Conservatório Belas Artes, de Joinville, onde vivo há quase 30 anos -, pelos mais bonitos cinco anos de minha vida. Mãe orgulhosa e avó mais que coruja, tenho o privilégio de ter sido escolhida pelo também jornalista Guilherme Diefenthaeler para caminhar pela vida. E pela arte.